Contado parece irreal, mas aconteceu!
Meados da década de 60, eu e mais quatro santarenses
passamos por uma situação aflitiva, num acidente de carro, com alto risco de morte.
Cinco adultos dentro
de um pequeno Renault Dauphine!
Desconfortavelmente sentado na vaga do meio do banco traseiro, muito prensado, não podia mexer-me.
No carro zero km, viajamos
para uma povoação próxima a Lamego, para entregar aos familiares de um
amigo do dono do carro uma encomenda, trazida da ex colônia Guiné. Ao chegar fomos recepcionados na adega da casa
com farta mesa, vinho, pão e enchidos
caseiros: chouriço e presunto. Região famosa por fazer essas deliciosas especiarias,
bem...! Bom demais para recusar, acabamos abusando do tinto.
No regresso para casa,
a 100 Km/h, estávamos alegres e pândegos, cantarolando animadamente quando, de
repente, numa pequena curva, pouco acentuada, o areão junto à berma da estrada levou
o Dauphine a sair de lado e passar
raspando por uma placa de paragem de ônibus. Esse contato com a placa fez o
veiculo retornar para a estrada. Fora ali
posicionada milimetricamente para evitar
gravíssimo acidente. Sorte, ou algo inexplicável para agnósticos, funcionou a nosso favor.
Fracote de suspensão, estava justificado o apelido ganho no
Brasil de “Aerocapotable”!
Tudo foi muito rápido, a manobra para evitar o iminente
acidente nos deixou tensos, com os olhos fixos no motorista e no que vinha pela
frente na estrada. De repente dou conta que
a porta traseira abriu e o amigo, ao meu lado, de terno preto, saiu sugado pelas
forças que nos empurravam para a lateral, o casaco com forro de cetim branco
virou do avesso e um corpo alvinegro, dando
cambalhotas, saiu rolando morro acima feito bola, cena que me deixou estupefato
com o que posso chamar de crise nervosa. Sem me poder conter, comecei a rir da
cena inusitada, sem conseguir falar para avisar o motorista para parar. Tentava avisar, gesticulando e apontando para
o lado e para trás, mas não fui entendido, sendo repreendido por todos, pois estava
a tirar a concentração do motorista e, ainda por cima, rindo de uma situação de
pavor! Só depois de algum tempo, já com o carro sob controle, entenderam o meu
nervosismo, deram pela falta do colega, pararam e deram ré para pegar o
acidentado. Aparentava estar bem, caminhava desengonçado descendo a encosta na
nossa direção sacudindo a terra do terno, aparentava não ter ferimentos, nenhuma
distensão ou osso quebrado! Ainda bem, não
se feriu, dissemos nós.
No caminho resolvemos parar em Viseu para deixar o carro na
oficina para conserto e ir até à esplanada do Rossio decidir o que dizer ao
chegar em Santar! Depois de uma rodada de finos e troca de sugestões ficou acertado contar que
o motor esquentou, uma mangueira rasgou
vazando a água. Ficou na oficina aguardando a peça, em falta, chegar.
Só que, no dia seguinte, o aparente incólume acidentado não teve
condições para se levantar da cama, sentia o corpo todo dolorido, como se tivesse
sido triturado. E foi, coitado!
Como a mentira tem pernas curtas, não poderia haver outro
desfecho: rapidinho Santar inteiro ficou sabendo uma parte da verdade!
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