Tinha 15 anos em 1962, quando comecei a sentir o malefício da ditadura. Ao comprar um pequeno rádio portátil a pilhas - era lei ter de pagar uma licença anual pelo uso do rádio. Como não me propus pagar, só escutava música em casa e com o som no mínimo, não fosse um dedo duro, do sistema (PIDE), denunciar-me e ter o vexame de pagar multa. Em Viseu, de noite, não passava perto de determinada rua, no final da Rua Direita (as “quintas do galo e do grilo”, da época), não temendo a fúria das esposas visienses, mas a implacável repressão policial. Vivi os 12 anos anteriores ao 25 de abril, consciente dos temores da ditadura. Posso avaliar o que é uma ditadura, sobrevivi a uma, dela tirei a experiência que me dá energia para repudiá-la.
Com o professor Marcelo Caetano, sucessor de Salazar, pude notar mudanças na política. Começou o seu governo abrindo lentamente as portas da ditadura à democracia. Deu início a uma pequena abertura política, permitindo maior liberdade de expressão. Criou as pensões para os trabalhadores do campo e autorizou o funcionamento dos sindicatos (lembro que meu salário duplicou, muitas grandes empresas demitiram funcionários, a VW, desprevenida, demitiu metade dos seus funcionários).
O governo do professor MC, criticado pelos apaniguados da ditadura, pelos militares insatisfeitos com a guerra nas colônias e pela insatisfação popular, aumentada pela recessão econômica de 73 (crise mundial do petróleo), ficou debilitado, facilitando a ação do movimento democrático de mudança, dos jovens oficiais militares. Acredito que os ventos da democracia soprados no mundo não tardariam a chegar a Portugal, era uma questão de tempo. Tempo de mudança há décadas angustiosamente desejada sem chance de, por mais tempo, ser contida. Mas entendo que Portugal estaria melhor hoje se a abolição da ditadura fosse mais lenta e consensual. Assim como a retirada militar, apressada, das províncias ultramarinas (os militares saíram com o rabo entre as pernas), causou muito sofrimento e morte aos patrícios, fazendeiros e outros trabalhadores, emigrantes do continente. Provavelmente não teria acontecido uma carnificina comunista que, para sempre, vai manchar a história do país, uma vergonha! Por pouco não derrubaram a ponte Salazar. Por aí podemos imaginar os prejuízos causados, na cultura, na economia, no patrimônio nacional, afetando pessoas, influindo no futuro do país.
Por muito tempo, vamos ter de pagar a ação raivosa duma minoria ditatorial e homicida. Enquanto não forem proibidos em público, como em alguns países do Leste da Europa, os símbolos foice e martelo, assim como é a suástica, a democracia não vai prevalecer, nunca seremos um país com autonomia, independente e auto-sustentável. Os fanáticos assassinos fascistas nazis foram fichinhas, comparados com seus iguais, os assassinos ditadores comunas.